Complexo de Haiti

Após deixar estado de atenção, São Paulo tem 179 km de congestionamentos

Recorde do ano é de 209 km de lentidão, segundo a CET.

Zona sul é região com trânsito mais complicado.

(Original aqui.)

Como todos sabem, há dois meses e meio houve um terremoto no Haiti (magnitude 7,0) que matou 230 mil pessoas.

Como todos sabem, há quase um mês houve um terremoto no Chile (magnitude 8,8) que matou menos de mil pessoas.

Parte da explicação a respeito da diferença do número de mortos é dada pelas diferenças sismológicas entre os dois terremotos — tipos diferentes no movimento das placas tectônicas — , bem como pelo fato de que o terremoto no Haiti aconteceu praticamente sob a cidade de Porto Príncipe, a 10 km abaixo da superfície, enquanto que o terremoto no Chile ocorreu no mar, a 35 km de profundidade. Além disso, o terremoto no Haiti aconteceu em área densamente povoada, enquanto que o terremoto no Chile, por ter ocorrido no mar, foi amenizado devido à água — ainda que isso tenha ocasionado tsunamis na costa chilena.

Contudo, é inegável que há também a diferença do “fator humano” no que diz respeito à diferença entre o número de mortos: as construções no Chile são mais preparadas para terremotos e o país tem um mapa das áreas de risco para prever quais são os lugares mais vulneráveis a terremotos, o que não acontece no Haiti.

Ou seja, bem ou mal, a preparação prévia do governo chileno na prevenção de terremotos — por saber que eles podem ocorrer a qualquer momento — evitou um grande número de mortes decorrentes do terremoto.

E o Brasil?

O governo brasileiro sabe que o período do verão é de calor, mas também de chuvas, especialmente na região Sudeste.

O governo brasileiro sabe que as chuvas na região Sudeste, quase sempre, são torrenciais.

O governo brasileiro sabe a quantidade de água que cai na região Sudeste.

Em suma: o governo brasileiro tem muita informação a respeito do clima na região Sudeste.

E o que faz o governo brasileiro? Age “à lá Haiti”: não faz absolutamente nenhuma preparação para evitar as consequências da chuva.

É óbvio que o governo brasileiro não pode evitar a chuva em si.

Mas poderia muito bem investir em medidas preventivas que evitassem tragédias decorrentes da chuva — tais como a dos deslizamentos em Angra dos Reis e em Búzios. Poderia investir em medidas que evitassem o congestionamento de São Paulo — ou que, pelo menos, amenizassem tal congestionamento.

E assim “vamos indo” — com as chuvas ocasionando mortes, inundações e prejuízos um ano atrás do outro. E assim continuará a ser, enquanto o governo brasileiro se identificar mais com o governo haitiano — que sabe que está em regiões de terremotos e não fez nenhum planejamento prévio. Se o governo brasileiro se identificasse com o governo chileno — que sabe que terremotos podem acontecer a qualquer momento e, portanto, tenta prevenir as consequencias do possível terremoto — , com certeza o resultado de chuvas exageradas seria menor. E ainda temos uma vantagem incrível: terremotos não são muito previsíveis, mas as chuvas na região Sudeste são.

Em resumo: o governo brasileiro poderia ter um mínimo de planejamento que amenizasse as consequências das intempéries nas cidades brasileiras. O governo tem recursos técnicos e financeiros para pôr em prática tais medidas — o que não tem é vontade política, porque isso, com certeza, mexe com o interesse de muita “gente grande”.

E que fique claro: quando uso a expressão “governo brasileiro”, não me refiro apenas ao governo federal (Lula e PT), mas também ao governo paulista (Serra e PSDB), sendo que talvez este último tenha ainda mais responsabilidade pelo caos em que São Paulo se transforma quando ocorre a menor chuva na região.

0 comentário em “Complexo de Haiti”

  1. Esta publicação foi de uma importante analogia entre terremotos que aconteceram no continente americano.
    Estou realizando uma Pós-Graduação em Gestão de Emergências e Desastres e afirmo que este material fpoin de suma importância.
    Sempre defendi que a prevenção era o melhor investimento, ainda mais em situações de desastres, sejam de causas naturais ou humanas.

    Obrigado!

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