É realmente incrível a capacidade dos parlamentares brasileiros em falarem asneiras. A bola da vez é o recém-eleito presidente do Conselho de Ética do Senado Federal, senador Paulo Duque (PMDB-RJ). A pessoa mal chegou ao cargo (foi eleito no último dia 15/07) e já deixou clara sua opinião sobre a situação de José Sarney – cujo caso o senador Duque irá julgar. Ele deixou claro que irá proteger o presidente do Senado ao atacar o PSOL, partido autor de representação contra José Sarney:
– [O PSOL] É um partido pequeno que ainda não existe, como o PT já foi um dia. Talvez cresça.
O senador Duque, seguindo os passos do deputado Sérgio Moraes (PTB-RS), também está se lixando para a opinião pública, explicitando que não se deixará levar pela pressão popular ou da imprensa:
– Não estou preocupado com isso. A opinião pública é muito volúvel. Ela flutua. E quem tem muita influência sobre ela são vocês, jornalistas.
Duque disse ainda não ter problemas com as cobranças da população caso o Conselho de Ética arquive as denúncias contra José Sarney:
– Não temo ser cobrado por nada. Quem faz a opinião pública são os jornais, tanto que eles estão acabando.
O senador ainda afirmou acreditar que é “normal” se fazer nomeações políticas no Brasil, deixando claro que, em sua opinião, Sarney não cometeu nada ilícito:
– Nomeação política, por exemplo, existe desde que Brasil é Brasil. Pero Vaz de Caminha pediu emprego para o primo. [Sarney] prestou muitos serviços ao país. Ficarem vasculhando a vida dele porque nomeou um neto é bobagem.
Para fechar com chave de ouro, mais uma frase do senador Duque:
– Os atos secretos são uma bobagem inventada por alguém.
Ou seja, o senador Duque – eleito como suplente, ou seja, sem nenhum voto popular – mal chegou ao Conselho de Ética e já fez besteira. Por um motivo simples: como pode um juiz – com as devidas analogias, esta é a função dele – deixar claro sua opinião? Como pode um juiz deixar de lado sua isenção e externar o que pensa a respeito do caso que irá julgar?
O pior de tudo é o senador Duque dizer que “sempre houve indicação política” – e, portanto, se sempre houve, qual o problema em continuar havendo? O senador mostra uma completa falta de senso cívico, mostra sua completa falta de pudor em relação à corrupção que assola a política brasileira. Parece que seu sentido de ética é bem simples: roubar pouco é ético. O problema só é grave se muito tiver sido roubado: se for pouco, não tem problema.
O senador mostra ainda sua baixa capacidade como legislador. Quase o ouço dizendo: “se tudo sempre foi assim, pra que mudar?” Se sempre houve roubalheira, por que impedi-la agora? Se sempre uns mataram os outros, para que punir os homicidas? Nesse contexto, o Senado serve para que? Para criar leis que impeçam apenas crimes “enormes”, para punir apenas muita roubalheira, já que a crimes pequenos, “coisa pouca”, não devem ser punidos? A suposta “ingenuidade” na fala do senador é tamanha, e tão revoltante, que o momento nos faz ficar desesperançosos, ainda mais com o recesso legislativo que se inicia amanhã e que irá arrefecer o clima aqui em Brasília – tanto é que o senador José Sarney deu “graças a Deus” pelo início do recesso.
Só há uma saída para toda esta situação: a conscientização popular. Enquanto o povo brasileiro continuar em sua apatia política, enquanto houver pessoas que acreditem no chavão de que “política não se discute”, enquanto houver pessoas que afirmem que não gostam de política, pouco – arrisco-me a dizer que nada – irá mudar. Porque é o povo que elege os parlamentares, e se o povo continuar achando que, por votar, já fez sua parte, nada – repito, nada – irá mudar.