Publicado originalmente no site Perspectiva Política
Como os leitores devem saber, durante os meses de dezembro de 2009 e janeiro de 2010 estive viajando para fora do Brasil. Tive a possibilidade de visitar três países completamente diferentes do Brasil: Egito, Turquia e Ucrânia. Nas primeiras postagens de 2010 pretendo fazer um breve relato da viagem a esses países, apresentando não apenas elementos das esferas política, econômica e social, mas também aspectos mais “turísticos” propriamente ditos.
Na coluna de hoje falarei um pouco a respeito do Egito, minha primeira parada. Logicamente, o impacto acontece logo ao desembarcarmos: informações no aeroporto em árabe. Para aqueles que, como eu, não falam nem leem a língua, é um pouco complicado — e acredito ser um momento importante para sentirmos como um analfabeto se sente no Brasil. A “salvação” vem apenas por meio de alguns sinais básicos em inglês, que indicam a saída e o local para pegar a bagagem. Fora do aeroporto, nada feito: tudo em árabe.
Mas não é difícil se virar no país. Uma boa parcela da população egípcia entende um pouco de inglês, o que facilita a comunicação no que diz respeito a negócios. Porém, tirando isso tudo se complica: é relativamente difícil sustentar uma conversação sobre outro tema que não negócios. Por exemplo: a primeira cidade que visitei foi Aswan, no sul do Egito. Eu havia contratado previamente um táxi que me levaria do aeroporto ao hotel, mas eu não sabia se deveria pagar ao taxista ou ao hotel. Ao perguntar isso para o motorista, o mesmo nada compreendeu e não soube me responder: ele basicamente sabia em inglês o nome dos lugares por onde passávamos, mas não sabia dar nenhuma explicação aprofundada. E o mesmo ocorreu em várias outras oportunidades, inclusive no Cairo: se sairmos da esfera dos negócios (e por negócios quero dizer negociação de valores por um souvenir ou por um tour de camelo, por exemplo) e da esfera do turismo em geral, torna-se complicada a comunicação. Comer em um restaurante local é uma aventura, especialmente quando não há nada em inglês no menu, só em árabe… A comida, aliás, é um caso à parte: o Egito possui uma culinária bastante diferente da nossa, com muitos pratos deliciosos — e outros nem tantos. O que mais me agradou foi a possibilidade de comer o que chamamos de “pão sírio” com muito mais frequência do que aqui no Brasil.
Falar a respeito dos monumentos egípcios é desnecessário, creio eu. Estar em frente às três pirâmides mais famosas é algo simplesmente indescritível. Tive a mesma sensação que tive quando visitei campos de concentração e de extermínio nazistas na Alemanha e na Polônia no ano passado: ler sobre as pirâmides e ver fotos delas é uma coisa, estar à frente delas é outra coisa — e entrar nelas, uma experiência ainda mais indescritível. Ver a esfinge também é surpreendente, ainda que — como diz o guia “Lonely Planet” — ela se pareça com um astro de cinema: ao vivo é menor do que parece por fotos. Também foi surpreendente visitar a pirâmide de degraus em Saqqara e as pirâmides Vermelha e Inclinada em Dahshur, bem como visitar o Vale dos Reis em Luxor, o Templo de Karnak em Luxor ou o Templo de Abu Simbel. Isso sem falar em outro verdadeiro “monumento” egípcio, o Rio Nilo: navegar em suas águas por três dias e duas noites em uma felucca — barco sem motor no qual cabem até 10 pessoas — é uma experiência única para o visitante.
Mas nem só de monumentos antigos vive o Egito atual — e aí entramos em uma característica extremamente negativa dos egípcios, pelo menos para mim: tudo, absolutamente tudo, é avaliado em termos monetários. Algo — ou alguém, no caso de um turista — só é bom se puder ser monetariamente valorado. E tal valoração geralmente é absurda. Por exemplo: ao sair do Vale das Rainhas, em Luxor, um vendedor me ofereceu três miniaturas de plástico das pirâmides. Valor original pedido pelo vendedor: 500 libras egípcias (pela cotação da época, algo em torno de 160 reais). Disse que não e continuei andando até onde meu táxi estava me esperando — e essa caminhada não tinha mais do que uns 50 metros. Nesse trajeto, o preço caiu de 500 libras egípcias para 30 libras egípcias — preço que poderia ter caído ainda mais, tenho certeza.
Outra característica que considerei extremamente negativa foi o fato de que eles pedem gorjeta para tudo. Não importa o que for, se eles abrirem a boca para falar com você e você der atenção… Meu amigo, arrumarás uma bela dor de cabeça. E muitas vezes eles pedem dinheiro “do nada”. Por exemplo, fui ao banheiro no templo de Hórus, em Edfu, e perguntei para um funcionário do templo onde ficava o banheiro. Só por isso ele já pediu “money, money”. Falei que não ia dar e o funcionário ficou bastante irritado. Não queria me deixar entrar no banheiro, e só parou de me atrapalhar quando eu disse que ia chamar a polícia. Depois, no templo de Luxor, em cada “sala” do templo fica um segurança, e quando você entra sozinho na sala, lá vem o segurança querer mostrar uma “parte especial” da sala — como se você não fosse olhar tudo por si mesmo… E se você cair na conversa, já era, eles pedem mesmo dinheiro. O jeito é ser grosso ou não dar atenção e deixá-los falando sozinho. E mesmo assim eles insistem… Eu adotei a tática de não responder em inglês, só em português. Aí eles ficam meio perdidos, tentam uma segunda vez — alguns até falam um “hola” em espanhol — , mas acabam desistindo. É cansativo.
Acredito que uma visita ao Egito pode mudar a cabeça das pessoas, não apenas por ver todos aqueles monumentos — e ficar imaginando como foi possível, há tantos mil anos atrás, a construção de edificações nas quais não passa uma folha de papel entre as pedras — mas também para ver que nós, brasileiros, quando comparados ao egípcios em termos sócio-econômicos, somos ricos. Para ver que nós, em termos políticos, somos muito mais democráticos que eles. E para perceber o quanto o Islamismo é forte no Egito, apesar de este ser — creio eu — o país muçulmano mais “liberal” do Oriente Médio. Mas os aspectos sócio-econômicos, políticos e religiosos ficarão para a postagem da semana que vem.