Nos países em que as eleições são sempre plebiscitárias vota-se em tudo, até em normas para se recolher o cocô do cachorro nas calçadas.
Li, certa vez, que num desses países — acho que era a Noruega — não era incomum um eleitor ficar até meia hora na cabine eleitoral, marcando numa célula tamanho ofício suas opções, não só entre candidatos para representá-lo mas entre grandes e pequenas questões da vida comunitária, como usinas nucleares, sim ou não? Ou: cocô na calçada, quem é o responsável?
Pensei nesse eleitor e no seu poder de escolha lendo as notícias sobre as lambanças no nosso Ministério dos Transportes. Não podemos querer imitar os escandinavos e trocar nossas maquininhas de votar ligeiro por plebiscitos demorados, certo.
Mas quando foi que nos perguntaram se concordávamos que o Ministério do Transportes fosse doado ao PR? Quem autorizou o feudo com seu voto?
Quem, entre os eleitores, sabia da cláusula de exclusividade do acordo com o PR, quem aprovou a troca de um ministério, e um ministério cheio de dinheiro, por votos no Congresso? E logo com o PR, um partido que — pelo que se sabe — não representa nada a não ser sua própria gana?
Claro, ao apertar os botões da maquininha de votar o eleitor está dando aos candidatos da sua escolha o direito de fazer o que for necessário para governar, inclusive barganhas — ou alianças, que fica mais bonito. Está votando implicitamente em tudo que imagina que os candidatos pensem e pretendem.
Quem votou em Dilma ou no PT na maquininha fez, de certa forma, todas as opções que encontraria numa cédula plebiscitária, inclusive sobre como dispor do cocô de cachorro, para insistir na metáfora nojenta.
O acordo com o PR foi feito pelo Lula, decepcionando quem esperava que esse tipo de aliança o PT nunca fizesse. Mas a Dilma presidente também foi feita pelo Lula, que certamente sabia das suas implicâncias e da sua determinação. Dilma, desfazendo o acordo, estará redimindo Lula e o PT dos seus pecados por associação.
(Original aqui.)