“… Porque política, religião e futebol não se discute.” Errado. Discute-se sim, e muito.
Recentemente certa pessoa passou pela seguinte situação: em seu trabalho o acesso à rede interna não estava funcionando. O funcionário (ou colaborador, como se diz no mundo excessivamente “politicamente correto” de hoje) solicitou o auxílio da área responsável e recebeu a informação de que seu problema só poderia ser resolvido dali a três horas. Resultado: a pessoa passou três horas sem poder concretizar algumas coisas de seu trabalho, pois dependia do acesso à internet para fazê-lo.
Não pretendo entrar aqui no mérito da demora – se ocasionada por muita carga de trabalho daqueles que poderiam solucionar o problema, ou se ocasionada por má vontade ou algo do tipo. Mas a situação me chamou a atenção para a seguinte ideia: quantas e quantas vezes não nos deparamos com situações eminentemente políticas, nas quais acabamos “deixando de lado” por não nos darmos conta disto?
Max Weber, sociólogo do final do século XIX e início do XX, definiu três tipos puros de dominação: a tradicional, na qual “aquele que manda” o faz porque é tradição fazê-lo; a racional-legal, na qual existem regras estabelecidas que justificam e sustentam a relação de mando e obediência; e a carismática, na qual o líder o é porque possui características próprias que “encantam” seus subordinados. Para Weber estes tipos de dominação são legítimos porque são aceitos pelo subordinado: obedeço a um padre porque vejo nele o simbolismo da tradição católica; obedeço ao meu superior hierárquico em meu trabalho porque sei que há um regulamento que o permite me dar ordens; obedeço ao líder político ou ao esportista famoso porque vejo neles características pessoais e subjetivas que fazem com que se tornem lideranças naturais. Assim, na visão weberiana, a dominação é não apenas positiva, mas também necessária para a manutenção da vida em sociedade.
Por outro lado, Karl Marx, outro sociólogo do século XIX, acreditava que todo tipo de dominação só poderia ser negativa. Marx acreditava que toda e qualquer dominação só se caracterizaria pelo aspecto econômico – ou seja, os mais ricos dominariam os mais pobres -, e que isto não poderia trazer nenhum tipo de benefício à parte subordinada porque qualquer tipo de dominação tira a liberdade dos indivíduos e enfatiza a falta de igualdade entre eles – objetivo maior do pensamento marxista. Muitos poderão criticar Marx e dizer que ele foi reducionista, já que olhou apenas para o aspecto econômico da sociedade, mas vale ressaltar que deve-se ter a perspectiva histórica do momento em que ele escreveu. Ainda, nada impede que suas idéias sejam transpostas, de maneira análoga, ao mundo atual: se à época de Marx os economicamente ricos dominavam, hoje pode-se dizer que, além destes, os “intelectualmente” ricos dominam, perpetuando a desigualdade e, consequentemente, a falta de liberdade.
A apresentação destas ideias é fundamental para se chegar ao objetivo desta postagem: a qual tipo de dominação nos sujeitamos na atualidade? Quando tentamos fazer algo e somos impedidos por outros, ainda que de maneira formal, oficial, não estamos sendo dominados? É possível acabar com a dominação entre os seres humanos? Ou as relações de dominação são elemento inerente à natureza humana?
Termino esta postagem repetindo a frase inicial: “e tem gente que acha que política, futebol e religião não se discute.” Discute-se sim. Ou melhor, deve-se discutir sim. Mas muitos, por razões diversas, não o fazem, e ao não fazerem, perpetuam-se como dominados.