A entrevista do presidente Lula concedida ao jornal “Folha de São Paulo” (leia a íntegra aqui) me fez lembrar uma ideia há tempos debatida entre os cientistas políticos, especialmente os americanos: a de que é possível igualar as eleições as mercado. A ideia básica deste pensamento é a seguinte: qual o melhor mecanismo para a tomada de decisão no âmbito coletivo: a esfera política ou a esfera econômica? Qual destas duas esferas traz mais dividendos para o indivíduo? Além disso, com tais teorias buscou-se a utilização de métodos matemáticos que serviriam para prever o comportamento político dos indivíduos. Dentre os principais autores que gostaria de citar estão James M. Buchanan – prêmio Nobel de economia em 1986 – e Albert Otto Hirschman.
De maneira geral, levam-se em consideração os seguintes aspectos, que servirão de base para a decisão entre eleições ou o mercado como um processo de criação de decisões para o grupo social: 1) O grau de certeza; 2) O grau de participação social; 3) O grau de responsabilidade; 4) A natureza das alterações apresentadas; 5) O grau de coerção de cada uma delas; e 6) As relações de poder entre os indivíduos.
No primeiro aspecto, toma-se como base o fato de que o indivíduo tem o mesmo conhecimento tanto do mecanismo de funcionamento das eleições quanto do mercado. A partir daí, considera-se que na esfera do mercado o indivíduo é a entidade ativa e os resultados da sua ação virão para si próprio. Já na esfera eleitoral o indivíduo também é a entidade ativa, mas o resultado é dividido com toda a sociedade. Desta forma, o eleitor não sabe, de antemão, quais das alternativas propostas irá vencer. No mercado, o indivíduo sempre escolhe o produto que mais lhe agrada, enquanto que em uma eleição, por ele não saber quem irá ganhar, ele poderá votar em alguém que não goste.
Em relação ao segundo aspecto, é possível afirmar que o indivíduo tem uma participação não-social em relação ao mercado. Isto significa dizer que uma grande indústria não se importará caso um indivíduo deixe de comprar seus produtos, pois o indivíduo não sabe do seu papel em relação à alocação dos recursos necessários para a produção daquele produto. Já no caso das eleições, em princípio o indivíduo sabe que tem um papel fundamental na mudança das decisões sociais – ele sabe que está agindo mais pela coletividade do que por si próprio, e isto por duas razões: primeiro, ele vota de acordo com seus valores, enquanto que no mercado ele compra de acordo com seus gostos pessoais; segundo, sua escolha no mercado não é influenciada por ninguém, enquanto que em eleições o indivíduo pode ser influenciado a votar em alguém que não goste por causa das pesquisas (por exemplo, o “voto útil”).
O grau de responsabilidade, que é o terceiro aspecto, é diferente na hora de comprar algo e na hora de votar. Na eleição, a responsabilidade pela vitória de um candidato é dividida entre todos os eleitores, enquanto que a responsabilidade pela compra de algo é unicamente do consumidor. Isto implica no seguinte: em uma eleição, o indivíduo pode até deixar de votar, pois ele sabe que outros estarão votando “por ele”.
O quarto aspecto, e talvez um dos mais importantes, refere-se à natureza das alternativas apresentadas. No mercado existem vários produtos à disposição do consumidor. Assim, se o consumidor gosta mais de determinado produto, tudo o que ele tem de fazer é comprar mais o que gosta e menos daquele que ele não gosta. Nas eleições, por sua vez, as alternativas são mutuamente exclusivas: ou o eleitor escolhe o candidato “A” ou escolhe o “B”. Isto significa dizer que o poder do consumidor pode ser dividido entre um ou mais produtos, enquanto que o poder do eleitor concentra-se em um único candidato em detrimento dos outros.
O quinto ponto se refere ao grau de coerção tanto do mercado quanto das eleições. No mercado, o consumidor escolhe entre alternativas existentes e sabe clara e previamente qual será o resultado da sua escolha. Nas eleições, por outro lado, o eleitor escolhe entre alternativas potenciais e não está seguro em relação ao resultado da sua ação. Assim, as eleições são muito mais coercitivas para o eleitor, pois caso o seu candidato não ganhe, será obrigado a viver pelo tempo do mandato com um governante ao qual se opõe.
O sexto e último aspecto se refere às relações de poder entre os indivíduos. O mercado tem tendência a se basear na “não-igualdade” das pessoas, ou seja, o poder de compra de algumas é maior que o de outras. Isto implica dizer que, frente ao mercado, as pessoas ricas têm mais poder que as pobres. Por outro lado, nas eleições, pelo menos em teoria, todos são iguais, no sentido de que o voto de um milionário tem o mesmo peso e o mesmo poder que o voto de um mendigo. Desta forma, as eleições têm como princípio básico a igualdade entre as pessoas.
Apresentados tais pontos, pode-se dizer que, racionalmente falando, o mercado é a melhor ferramenta de escolha. Isto vale mesmo em relação à liberdade. Contudo, se analisarmos a motivação individual, as eleições são melhores que o mercado, pois elas dão uma maior sensação de participação no processo decisório do que o mercado, pois ela traz à tona o “melhor do homem” em relação ao interesse público.
Por enquanto, percebe-se claramente que a eleição de 2010 está sendo vista pelas duas principais “opções” – PT e PSDB – como um mercado eleitoral: os “produtos” estarão à disposição dos eleitores, e caberá a estes “comprarem” aquilo que mais lhe agrada. Uma pena que o processo eleitoral esteja se desenvolvendo em formato plebiscitário – pois, desta forma, tal processo em nada contribui para conscientizar o eleitor brasileiro da necessidade de participação efetiva em nossa democracia, em nada contribui para desvincular a ideia de que democracia é o mesmo que apenas eleições. Ainda mais porque não teremos um Procon ao qual poderíamos recorrer quando surgir nossa insatisfação com o “produto” que “compraremos” em outubro de 2010.
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