Pode parecer estranho dizer que a felicidade seja um direito a ser garantido pelo estado ao cidadão. Porém, é exatamente isso que está ocorrendo no momento no Congresso Nacional por meio da chamada “PEC da Felicidade”, que busca alterar o artigo 6º da Constituição Brasileira por meio da inclusão da busca da felicidade como elemento fundamental.
Uma das principais defensoras da ideia é a deputada federal Manoela d’Ávila. Abaixo uma entrevista com a deputada, na qual expressa suas ideias a respeito da PEC e também de outros temas fundamentais da política brasileira atual.
(Original aqui.)
Manuela: “Fazer política é lutar pela felicidade”
Dizendo que prefere buscar soluções para os problemas do que “ficar só reclamando”, deputada afirma que emenda constitucional pode assegurar o cumprimento de direitos hoje negados à população
“E aí, beleza?” O título da página pessoal da deputada federal Manuela d’Ávila (PCdoB-RS) na internet (www.eaibeleza.com.br) mostra que, a despeito do cargo que ocupa, a deputada prima pela descontração no contato com o eleitor. Despojo que, aliás, foi fundamental na obtenção dos 271.939 votos que a levaram para a Câmara, nas eleições de 2006, na condição de deputada mais votada do Brasil.
Parceira do Carnaval de Porto Alegre e tida como a musa da atual legislatura, o sorriso fácil tem sido a marca da parlamentar mesmo durante as mais acirradas discussões – em plenário ou em comissões temáticas. Afeita ao diálogo e ao confronto de ideias, a jornalista por formação deixou claro, em entrevista concedida ao Congresso em Foco no seu nada suntuoso gabinete, porque é parceira do Carnaval porto-alegrense e do movimento + Feliz. Com o apoio de políticos, artistas e outras personalidades, além de diversas entidades da sociedade civil, a iniciativa tem como objetivo incluir a busca pela felicidade no texto da Constituição Federal.
“Sou militante comunista há 12 anos, e fiz uma opção que me alegra todos os dias. Para mim, fazer política é lutar pela felicidade das pessoas. Acho que a saúde, a educação, a moradia são coisas que garantem a felicidade”, destacou a deputada gaúcha, que diz (e prefere) ser chamada de Manu pelos eleitores, mencionando direitos já definidos na Carta Magna e que seriam reforçados, como elementos fundamentais para que cada cidadão possa alcançar a felicidade.
Manuela convida as pessoas a, ao invés de apenas reclamarem e “diagnosticarem” as mazelas brasileiras, participarem efetivamente do processo de melhoria da vida social do país. Inclusive disputando eleições, como ela tem feito com êxito. “Tenho uma preocupação muito grande com a renovação do Congresso, e acho que as pessoas deveriam se envolver nesse sentido. Então que se filiem, se candidatem, mudem os partidos, tentem entrar para melhorar”, exortou a parlamentar, que foi a mais jovem vereadora eleita em Porto Alegre, aos 23 anos, em 2004.
Alguém se habilita?
Veja o que mais disse a deputada na entrevista:
Congresso em Foco – Qual a importância do movimento + Feliz?
Manuela d’Ávila — São duas questões centrais. A primeira delas é entender que a população brasileira tem direitos, e que esses direitos asseguram aquilo que a gente pode chamar de felicidade objetiva – que é ter direito a moradia, educação, trabalho, atendimento digno na rede de saúde. Esse é um dos debates centrais da proposta de emenda que garante a inclusão do termo felicidade na Constituição. Mas também existe um outro, que é motivar o próprio debate sobre os próximos direitos da população. Muitas vezes as leis têm dois objetivos. Um deles é alterar a legislação e garantir que ela seja mais dura para os infratores; mas outro objetivo é garantir os esclarecimentos à população, o acesso à informação, as campanhas que motivam as pessoas a respeitar as leis. Da mesma forma, a PEC tenta incluir aquilo que nós buscamos objetivamente, eu repito – porque, subjetivamente, não caberia na lei registrar o termo felicidade – mas também realizar um debate sobre isso com a sociedade. Eu acho que existe uma relevância grande nisso por alguns motivos. Por exemplo: nosso sistema de saúde cada vez mais abraça pessoas com as doenças da alma. Grande parte dos problemas que nós temos – seja por dependência química, seja por doenças causadas também quimicamente, como depressão e outras que são caracterizadas como problema de saúde mental –, isso também é infelicidade. Existe um amplo debate para ser feito em torno disso. Essa é uma das motivações da PEC.
A senhora falou em objetividade. Como poderia explicar que a expressão “busca pela felicidade” não assuma um caráter subjetivo e se torne um obstáculo ao movimento?
Estamos tratando da felicidade objetiva, que são os direitos. A felicidade subjetiva são as coisas que, individualmente, o ser humano escolhe – são os seus relacionamentos, as suas amizades, o amor. A nada disso nós estamos nos referindo. Nós estamos buscando uma base para a construção da felicidade objetiva, que são os direitos básicos do povo brasileiro – a moradia, a educação, o acesso à saúde. Eu poderia dizer assim: ter alguém doente em casa é sempre a mesma coisa. É? Não, não é. Ter alguém doente em casa é sempre algo triste, e isso é a tristeza subjetiva. Mas, ter condições de atender a um filho doente, ou não ter, diferencia as pessoas. Talvez aí esteja um exemplo que consiga clarear o que estamos doutrinando. Nós não temos como garantir que o Estado tem de dar conta das tristezas subjetivas daquele cidadão que tem um filho doente. Seria um absurdo, uma irresponsabilidade nós propormos. Mas o Estado tem de dar condição para aquele cidadão garantir uma vaga a seu filho em um hospital.
Como incluir a busca pela felicidade na Constituição se preceitos constitucionais básicos como saúde e moradia são descumpridos?
A luta para que a lei seja cumprida é uma segunda etapa após a aprovação dela. Aqui na Câmara nós aprovamos e fiscalizamos leis. Por exemplo, quando nós debatemos o tema da moradia. A Constituição garante a moradia digna, mas nós não temos políticas públicas que dêem conta de todo o déficit habitacional do país. A Constituição garante a educação, mas não temos garantia da educação, em todos os níveis, para nossas crianças e nossos jovens. Só que, quando temos a garantia legal do cumprimento disso, nós “empoderamos” a população para ela cobrar os seus direitos. Este é o grande desafio: fazer com que, de um lado, exista o direito na lei, porque senão não precisaria existir lei nenhuma. Só porque as leis não são cumpridas, não quer dizer que não precisaríamos de leis. Existe o trabalho escravo, por exemplo. Mas existe a CLT [Consolidação das Leis do Trabalho], que pode combater o trabalho escravo. Então as leis são aquilo que podem, junto com a participação da população, motivar mais essa participação e garantir que as pessoas exijam o cumprimento dos direitos a nós, políticos.
O direito à busca da felicidade registrado na Constituição pode fazer com que o cidadão se sinta impelido a exigi-lo?
Acho que nosso povo não se sente “empoderado” em relação a quase nenhuma de nossas leis. Não seria uma realidade distinta ou nova com essa lei. Nosso povo tem de perceber o seu poder na hora do voto, mas tem também de perceber o que é o poder na hora de cobrar que a legislação seja cumprida pelos poderes que têm esse papel – como é o caso, na maior parte das vezes, das instâncias do Poder Executivo. É evidente que colocar na lei não assegura o cumprimento da norma legal. Assim como em outras legislações, à medida que damos conhecimento ao povo sobre ela [a lei], o povo cobra. O Código de Defesa do Consumidor talvez seja uma prova disso. Ele começou, devagar, a ser aplicado, mas hoje nosso povo já sabe que não é qualquer relação que pode ser estabelecida dentro do comércio. Da mesma, nós já temos 20 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente e, ainda hoje, lutamos contra a pedofilia. Mas é aquela lei que embasa a nossa luta hoje.
A senhora acredita que seu poder de comunicação e interação com novas mídias foi determinante para que fosse escolhida a participar do movimento?
Acho que tem relação com várias coisas. Pela questão geracional, talvez eu seja uma parlamentar com potencial para estabelecer diálogo com a maior parte da população brasileira, que são os jovens. E que, por viverem em uma democracia, entre aspas, já consolidada e terem uma facilidade muito grande de compreender os seus direitos, já nascem em uma sociedade de direito. Esse é um objetivo da escolha. Acho também que, diferentemente de muitas pessoas, eu não fiz uma opção pela tristeza. Eu sou militante comunista há 12 anos, e fiz uma opção que me alegra todos os dias. Então, para mim fazer política é lutar pela felicidade mesmo, pela felicidade das pessoas. Acho que a saúde, a educação, a moradia são coisas que garantem a felicidade.
Na política a senhora está conseguindo ser feliz e garantir a felicidade dos seus eleitores, deputada?
Muitas vezes sim, outras vezes não. A política não é, necessariamente, uma atividade que nos deixa sempre feliz. Mas eu tenho a alegria de dormir com a consciência tranqüila de que, na medida das minhas possibilidades, eu luto incansavelmente para isso.
O povo brasileiro tem uma alegria inata. Muitos atribuem essa alegria a fatores como o clima, a natureza…
Não acho. É uma questão cultural mesmo. Nosso povo foi forjado em um grande processo de unidade. Somos uma nação com uma única língua, uma nação diversa. Nós temos inúmeras manifestações culturais, somos um país com uma riqueza alimentar. É muito mais fácil ser feliz em um país em que raras são as exceções. Não temos terremotos, por exemplo.
A CNBB fez objeções ao movimento ao alegar que caminhos para o casamento gay e o aborto, por exemplo, foram reivindicados como condições essenciais à busca da felicidade…
A CNBB é uma instituição muito respeitável, tem diversas pessoas respeitáveis, uma história de luta pela democracia em nosso país. Mas a igreja, assim como outros espaços, é um espaço de divergência e de múltiplas opiniões. Dentro da Igreja Católica, por exemplo, eu tenho uma afinidade muito maior com aqueles desenvolvem um trabalho social, com aqueles que entendem a luta das pastorais, que lutam pelos direitos da população. É verdade que a legislação pode abrir o debate para outros direitos sociais. Eu não acho que exista nenhuma proibição de um cidadão só se sentir feliz materializando sua união civil com uma pessoa do mesmo sexo, embora não seja sobre isso que verse a emenda constitucional. Sobre isso eu tenho um outro projeto, que dispõe sobre a união estável para pessoas do mesmo sexo.
Algumas pessoas criticam o movimento, alegando que os parlamentares deveriam se ocupar de questões que seriam mais urgentes…
Eu costumo responder para essas pessoas duas questões gerais. A primeira delas: todo cidadão, desde a Constituição de 1988, tem o direito de participar. Eu fiz a opção de não ficar reclamando da vida. Eu não reclamo nem da minha vida e nem das outras questões, eu vou lá e faço. Eu não vou ficar reclamando que o meu computador está estragado há semanas sem tentar consertá-lo. Essas pessoas têm o direito de concorrer às eleições, por exemplo. Então é bom que participem, se organizem e tentem mudar os partidos políticos. A maior parte das críticas delas é correta. Se elas têm a capacidade de estabelecer críticas, de fazer um diagnóstico correto ao paciente Brasil, então deveriam ajudar a curar o paciente. Existe uma grande quantidade de pessoas que sabem fazer o diagnóstico: o Brasil tem problema com a política, tem problema com isso e aquilo. Agora, nós queremos os médicos. É difícil assumir o compromisso de tentar resolver o problema. Diagnosticar não é fácil, mas não é a parte mais difícil. Eu convido essas pessoas sempre a participar. Eu tenho uma preocupação muito grande com a renovação do Congresso, e acho que elas deveriam se envolver nesse sentido. Então que se filiem, se candidatem, mudem os partidos, tentem entrar para melhorar. E a segunda questão que eu acho importante que as pessoas percebam, também nesse sentido de só reclamar e só falar mal, que nós temos um exemplo que é a aprovação do projeto ficha limpa. As pessoas que assinaram o projeto não ficaram só reclamando. Se elas ficassem só falando, deixariam os políticos de ficha suja ficarem aqui, por que não faziam nada, só reclamavam. As pessoas que se organizaram e aproveitaram a oportunidade de se envolver, de pressionar, de mandar e-mails, têm a prova de que se participar dá certo. Eu não gosto da desesperança, acho que é uma coisa muito perigosa, porque ela reforça a má política. Então, pensem no que significa concretamente a aprovação do ficha limpa.
Segundo estimativa do senador Cristovam Buarque, a aprovação da proposta levaria cerca de cinco anos…
É. Mas são cinco anos de um bom debate…
Mas e a impaciência do povo? Não seria um debate muito longo?
A gente tem uma pressa natural de quem quer ver as coisas resolvidas, ver as coisas mudarem. Mas dentro de uma república, de uma democracia que se consolida, o tempo está a nosso favor. A democracia brasileira tem apenas 20 anos. Nesses 20 anos nós já melhoramos muito. Quando eu me angustio sobre o que nós temos que fazer, ou sobre como as coisas demoram ou são difíceis – o excesso de pautas, a quantidade de problemas –, eu sempre penso nisso: “Bom, mas em 20 anos nós já conseguimos isso, isso e isso”. Então é óbvio que a gente tem pressa, a pressão popular ajuda. Mas, além de a pressão ajudar, também é preciso entender que a Câmara age de acordo com o ritmo da sociedade, a gente nunca consegue estar à frente do que a própria sociedade nos impõe.
Como é participar de um movimento que representa uma parcela da sociedade, digamos, do bem?
Aqui na Câmara tem muita gente do bem, e quem está aqui dentro sabe disso. Para mim, essas pessoas expressam coisas que a gente pode ver em todas as comunidades. Por exemplo, eu sou parceira do Carnaval de Porto Alegre, e eu vejo essa alegria em rostos que são desconhecidos de vocês [em Brasília], mas que são grandes artistas, pessoas que enfrentam grandes adversidades para fazer a alegria do povo da minha cidade. Então, essa alegria que esses artistas representam tem a cara de nosso povo. Eu fico feliz de estar do lado dessas pessoas, na maior parte do meu tempo tento justamente estar ao lado delas. E eu tenho a sorte de não ser chamada de deputada, de ser chamada de Manu pelos meus eleitores. Esse peso eu não carrego…
Diante de tudo o que de negativo já houve e ainda há na política, a senhora acredita que o Congresso é o lugar adequado para tratar da felicidade do povo brasileiro?
O Congresso é o lugar mais certo. Nosso esforço é que, cada dia que passa, o Congresso consiga representar mais a população brasileira. Na democracia, o lugar máximo dessa representatividade pública tem de ser o Congresso. Trazer as pautas da sociedade para dentro do Congresso é uma obrigação dos parlamentares. Se eu desacreditasse do Congresso, eu não poderia ser deputada. Eu acho muito errado pessoas que apenas falam mal do Congresso. Eu acredito na democracia e na consolidação da democracia a partir do Congresso Nacional. Eu sei dos limites do Congresso, como eu sei que o Congresso em Foco sabe, mas eu luto para mudar. Hoje, nós não dependemos mais da ação da instituição para garantir a transparência. O cidadão tem como forçar a transparência cobrando de seus parlamentares, cada um é um voto, votou em uma pessoa. Será que essas pessoas dialogam com as pessoas em quem elas votaram? Será que elas acompanham o trabalho? Hoje a internet permite isso. Permite a uma parcela, é verdade, do povo brasileiro, não é a todos. A Câmara oferece alguns serviços, como o 0800. Não é uma via de mão única. É um erro da população achar que só o Congresso tem a obrigação de ser transparente. A população também tem o dever de cobrar, e não só da instituição, mas cobrar individualmente. É certo que o Congresso não é apenas a soma dos 513 [deputados] mais 81 [senadores]. É mais do que isso, mas também é a soma, não é a negação da soma. A população tem o compromisso de cobrar da gente.
Os caras, e ela também, podem estar cheios de boas intenções, mas… trocam de celular como trocam de ano, de assessores, ou de partido político. Mas felicidades não é desfilar no carnaval, ter um carro na garagem a ser pago em 60 meses, uma televisão ’50 in 72 meses e o resto da vida ser chamado de… ladrão! Ter não é felicidade, viram?! Ou vão inventar o Bôlsa Felicidade ?! Então, fazer política é lutar pela felicidade das pessoas. Saúde, Educação, e moradia são coisas que garantem a felicidade. Pergunta-se : COmo deveríamos viver ? Qual o mais alto valor ? Qual o maior bem ? E a moralidade, a ética d’Ele- que (re)nasceu hoje(!), não era nóva, não! Não existe ‘nóva moralidade’. O que há são novas imoralidades… Toda sociedade sempre soube o que era bom pra ela. Nenhum indivíduo são e nenhuma sociedade justa jamais acreditaram que caridade, honestidade, misericórdia, lealdade e sabedoria eram coisas ruins ou imorais. Tampouco que injustiça, fraude, corrupção, ódio, mentira, inveja, vício, cueldade ou traição e insensatez fossem bens da humanidade. Esta consciencia é universal e eis aí a mensagem de Christo: todos podemos alcançar a felicidade eterna. E isto trata-se de algo em conjunto, de toda a humanidade, a comunidade humana, do esforço hercúleo dos bons sobre a Terra e de todos aqueles nomeados para vingar o sangue dos justos!