Enfim, a disputa entre dois economistas para comandar o país líder da América Latina, acabou. No domingo 31 de outubro, a mineira Dilma Rousseff obteve 56,05% dos votos válidos (55,7 milhões de votantes) superando ao paulista José Serra, com 43,95% (43,7 milhões de votantes).
Diante da vitória da coligação liderada pelo PT, a nação deparou-se com dois fatos históricos, ambos esvaziados de sentido pleno, apesar de toda histeria udenista da oposição.
Quem comandará o Poder Executivo é uma mulher e ex-guerrilheira. Ao contrário do significado latente destes dois símbolos, a presidente não encarna nem uma crítica do patriarcado ou da sociedade machista e menos ainda alguma forma de ideal socializante ou de antagonismo das maiorias contra a classe dominante e as elites dirigentes.
O país votou na “paz social” com distribuição paulatina e comedida de renda, e foi só. As pautas das esquerdas, como a descriminalização do aborto e a abertura dos arquivos da ditadura, até agora ficaram pendentes, não sendo convidadas para o baile da vitória.
Os disputantes na reta final de campanha, tampouco entraram nas duas reformas consensuais entre os analistas e críticos do sistema.
A primeira, a política, é impensável sem uma legislatura exclusiva, uma vez que não se espera de um agente político recém empossado, o ato de cortar na própria carne retirando atribuições e prerrogativas de si mesmo.
A segunda, a tributária, implica não apenas em diminuir a carga de imposto que incide em cascata sobre o salário e o consumo, como também em avançar no federalismo fiscal, de modo a redistribuir recursos de forma equivalente entre os três níveis de governo.
Uma vez dotados de orçamentos, estados e municípios poderiam ser alvos da pressão popular, de forma direta. O consenso quanto a esse tema é nem pensar. Como nada disso irá ocorrer nos próximos quatro anos, a meta da governabilidade não terá obstáculos vindos de uma improvável polarização da ordem social e tampouco de um rearranjo institucional por dentro das regras do jogo.
Como já disse acima e em artigos anteriores, dificilmente o triunvirato do Campo Majoritário, composto por José Eduardo Dutra, José Eduardo Cardozo e o homem de ligação com os líderes econômicos do Brasil, Antonio Palocci, terá problemas com a domesticada ala esquerda de seu partido. Cada vez mais diluídas e com discurso lavado, estas correntes não têm peso para mudar os rumos de governo, e nem sequer para influir em decisões estratégicas da Presidência, a exemplo da Usina de Belo Monte e da vontade manifesta em transpor as águas do Rio São Francisco.
A pendência a ser sanada é na divisão de poder com os aliados mais à direita. Os problemas domésticos do Executivo advirão da ampla coligação, composta de dez partidos (PT, PMDB, PDT, PSB, PC do B, PR, PRP, PTN, PSC e PTC), com especial atenção para o aliado necessário, mas pouco ou nada desejável no comando direto.
Segundo a estratégia política da direção nacional petista, o PMDB do vice Michel Temer e dos caciques oligarcas estaduais, seria o fiel da balança ao ocupar um espaço considerável na centro-direita, criando condições para brigar pela vitória na corrida presidencial em todos os colégios eleitorais. Uma vez acertada a previsão, é hora dos peemedebistas cobrarem a fatura.
Eis o custo da nova governabilidade.
Bruno Lima Rocha é cientista político
(Original aqui.)