“O poder tem a tendência a se corromper e o absoluto poder corrompe absolutamente.”
Por Leonardo Boff (01/12/2014)
Pelas mídias sociais fui atacado ferozmente por ter apoiado o projeto político do PT e da Presidenta Dilma Rousseff, sempre com o mesmo argumento: por que não reconhece e escreve contra a corrupção? Escrevi várias vezes neste jornal (JBonline). Repasso algumas ideias como resposta.
Segundo a Transparência Internacional, o Brasil comparece como um dos países mais corruptos do mundo. Sobre 91 analisados, ocupa o 69º lugar. Aqui ela é histórica, foi naturalizada, considerada com um dado natural. É atacada só posteriormente quando já ocorreu e goza de impunidade.
Só este dado denuncia a gravidade do crime contra a sociedade que a corrupção representa. Todos os dias, mais e mais fatos são denunciados como agora com a corrupção multitudinária e bilionária na Petrobras, envolvendo dirigentes, partidos e grandes empreiteiras. Como compreender este perverso processo criminoso?
Comecemos com a palavra corrupção. Ela tem origem na teologia. Antes de se falar em pecado original, a tradição cristã dizia que o ser humano vive numa situação de corrupção. Santo Agostinho explica a etimologia: corrupção é ter um coração (cor) rompido (ruptus) e pervertido. Cita o Gênesis: “a tendência do coração é desviante desde a mais tenra idade” (8,21). O filósofo Kant fazia a mesma constatação ao dizer: “Somos um lenho torto do qual não se podem tirar tábuas retas”. Em outras palavras: há uma força em nós que nos incita ao desvio e a corrupção é um deles.
Como se explica a corrupção no Brasil? Identifico três razões básicas entre outras: a histórica, a política e a cultural.
A histórica: somos herdeiros de uma perversa herança colonial e escravocrata que marcou nossos hábitos. A colonização e a escravatura são instituições objetivamente violentas e injustas. Então as pessoas para sobreviverem e guardarem a mínima liberdade eram levadas a corromper. Quer dizer: subornar, conseguir favores mediante trocas, peculato (favorecimento ilícito com dinheiro público) ou nepotismo. Essa prática deu origem ao jeitinho brasileiro, uma forma de navegação dentro de uma sociedade desigual.
A política: a base da corrupção política reside no patrimonialismo e no capitalismo sem regras. No patrimonialismo não se distingue a esfera pública da privada. Os que estão no poder tratam a coisa pública como se fosse sua e organizaram o Estado com estruturas e leis que servissem a seus interesses sem pensar no bem comum. Há um neopatrimonialismo na atual política que dá vantagens (concessões, médios de comunicação) a apaniguados políticos.
Devemos dizer que o capitalismo aqui e no mundo é em sua lógica, corrupto, embora aceito socialmente. Ele simplesmente impõe a dominação do capital sobre o trabalho, criando riqueza com a exploração do trabalhador e com a devastação da natureza. Gera desigualdades sociais que, eticamente, são injustiças, o que origina permanentes conflitos de classe. Piketti tem razão. A democracia pretendendo ser representativa de todos, na verdade, representa os interesses dos grupos dominantes e não os gerais da nação. Esta situação configura uma corrupção já estruturada e faz com que ações corruptas campeiem livre e impunemente.
Cultural: a cultura dita regras socialmente reconhecidas. Roberto Pompeu de Toledo escreveu em 1994 na Revista Veja: “Hoje sabemos que a corrupção faz parte de nosso sistema de poder tanto quanto o arroz e o feijão de nossas refeições”. Os corruptos são vistos como espertos e não como criminosos que de fato são. Via de regra podemos dizer: quanto mais desigual e injusta é uma sociedade, em especial, um Estado, mais se cria um caldo cultural que permite e tolera a corrupção.
Especialmente nos portadores de poder se manifesta a tendência à corrupção. Bem dizia o católico Lord Acton (1843-1902): “o poder tem a tendência a se corromper e o absoluto poder corrompe absolutamente”. E acrescentava: “Meu dogma é a geral maldade dos homens portadores de autoridade; são os que mais se corrompem”.
Por que isso? Hobbes no seu Leviatã (1651) nos acena para uma resposta plausível: “a razão disso reside no fato de que não se pode garantir o poder senão buscando ainda mais poder”. Lamentavelmente foi o que ocorreu com setores do PT (não com todo o partido) e de seus aliados. Levantaram a bandeira da ética e das transformações sociais. Mas ao invés de se apoiar no poder da sociedade civil e dos movimentos e criar uma nova hegemonia, preferiu o caminho curto das alianças e dos acordos com o corrupto poder dominante. Garantiu a governabilidade a preço de mercantilizar as relações políticas e abandonar a bandeira da ética. Um sonho de gerações foi frustrado. Oxalá possa ainda ser resgatado.
Como combater a corrupção? Pela transparência total, pelo aumento dos auditores confiáveis que atacam antecipadamente a corrupção. Como nos informa o World Economic Forum, a Dinamarca e a Holanda possuem 100 auditores por 100.000 habitantes; o Brasil apenas, 12.800 quando precisaríamos pelo menos de 160.000. E lutar para uma democracia mais participativa que se faz vigilante e que cobra inteireza ética de seus representantes.
(Original aqui.)
A unica forma de o PT se manter no poder, foi fazer alianças seja la quem for, resultando numa pessima imagem ao Partido, que dificilmente vai se livrar do estigma de um partido corrupto.Acho que trabalhadores se envolvendo com o poder politico, simplesmente se esquecem do seu passado e passam a receber os benesses do estado, nem sempre licitas.